Desde 1977 que o Conselho Internacional dos Museus (ICOM) organiza o Dia Internacional dos Museus, com o objectivo de promover o intercâmbio e enriquecimento cultural, o desenvolvimento da compreensão mútua, da promoção da cooperação e da paz entre os povos. Esta efeméride ocorre a 18 de Maio, ou em data/s próximas, e traduz-se na organização de eventos e actividades comemorativas, unidas internacionalmente pelo tema comum definido previamente pelo ICOM. Adoptado globalmente, cria um elo de dimensão planetária.
Em 2020 o tema do Dia Internacional dos Museus é Museus para a igualdade: diversidade e inclusão. Escolhido com antecedência, era imprevisível a circunstância em que o mundo, quase em uníssono, se encontra.
A equipa que actualmente constitui os órgãos sociais da Comissão Nacional Portuguesa do ICOM foi eleita a 9 de Março. O programa sufragado reflecte a preocupação com a necessidade de repensar as condições materiais com que se confronta a maioria dos profissionais e instituições museológicas nacionais. De forma natural e felizmente plural, diversas realidades espelham a multiplicidade de projectos, tutelas e circunstâncias. Um encerrar de portas total, a ausência do contacto físico com o público durante dois meses, não era imaginável. Aconteceu! Em Portugal como no mundo inteiro, todos percebemos que o dia 18 de Maio de 2020 dificilmente será como antes.
Para dentro e para fora, para as suas equipas e para os que visitam, fruem, aprendem e confraternizam nos museus, o desafio é enorme. A presença por tempo ainda indeterminado das medidas sanitárias impostas pela pandemia do vírus Covid 19 vem alterar as rotinas e impor novos comportamentos. Acreditamos que conseguiremos com segurança adaptar-nos às novas circunstâncias, mas com que consequências? As limitações afectarão de que forma o relacionamento com o público? Para já é certa a dificuldade de fazer inaugurações, visitas guiadas, oficinas, serviço educativo, entre outras actividades que considerávamos normais, diria mesmo essenciais, tornaram-se difíceis pelo que implicam de concentração nos espaços e de interacção próxima entre pessoas.
Com generosidade e profissionalismo desdobrámo-nos em propostas de conteúdos digitais, levámos colecções, espaços, histórias e conhecimento até à casa de muitos através das redes digitais. O acelerar da revolução digital seguramente, mas a consequência será o fim da materialidade que caracteriza o museu? Regressar à fruição individual, passiva, característica do museu oitocentista, requalificada através de uma versão tecnologicamente actualizada, mas ainda mais individual, não será a solução.
Após semanas de contactos mediados por écrans o Homem passará a dispensar a dimensão sensorial? Começaram já os estudos e a avaliação sobre o impacto do intensificar destes recursos. No imediato a preocupação é cumprir a missão definida pelo ICOM e ‘reunir, conservar, estudar, comunicar, expor…’ a memória colectiva da Humanidade. Este desafio é tanto maior quanto esta crise acentua as desigualdades, fragiliza a sociedade como a conhecemos e exige novas e ousadas soluções.
Nos últimos anos tem havido um desinvestimento generalizado nas instituições, com uma preferência manifesta por actividades efémeras, opções desmaterializadas, recurso a soluções que assentam num modelo de fornecimento de serviços. As equipas técnicas permanentes envelhecem e fragilizam-se, a identidade própria esboroa-se face a programações que respondem a lógicas quantitativas e imediatas, em detrimento da construção de saberes e de solidariedades, de promoção do sentido crítico e da cidadania.
É agora o momento de ousar, de construir uma alternativa sustentável e comprometida.
A Cultura demonstrou ser nestes tempos singulares uma das âncoras da Humanidade, os seus actores desdobraram-se de forma solidária para serem a rede comum a toda a sociedade. É justo pedir a esta mesma sociedade que reconheça este contributo e esta centralidade na vida comum. Não esqueçamos contudo que o reforçar deste paradigma digital não chega a todos, estas propostas que muitos vaticinam ser o futuro, alargam ainda mais o fosso entre os que têm acesso e utilizam as tecnologias e os que, por falta de recursos ou de competências técnicas, não conseguem aceder ao universo digital. Veja-se o caso do ensino à distância e da necessidade de encontrar soluções para tantos que ainda não têm acesso a estes recursos. Os museus podem e devem ser instrumentos de inclusão e promoção da igualdade, respeitando a diversidade que só a pluralidade garante.
Os museus 2020 são instituições com futuro e para o futuro, a sua capacidade de enfrentar desafios e servir a sociedade terá necessariamente de assentar no reforço de estratégias de interligação com as comunidades em que estão inseridos e na aposta de pertença a redes de dimensão e geografia variáveis.
Aos profissionais de museus um grande obrigado pelo esforço que têm vindo a desenvolver, pela capacidade de se reinventarem e reorganizarem. O futuro é desafiante mas, mais uma vez, saberemos superar as dificuldades e estar mais presentes que nunca.
De forma virtual ou já fisicamente, os museus estarão neste dia de portas abertas a todos. Visitem-nos, por favor!
Direcção da Comissão Nacional Portuguesa do ICOM
18 de maio 2020, Dia Internacional dos Museus
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