
O Futuro dos Museus em Comunidades em Rápida Transformação
Celebrado anualmente no dia 18 de maio, o Dia Internacional dos Museus é uma oportunidade para refletirmos sobre o papel fundamental dos museus na preservação da memória coletiva, na educação e no fortalecimento cultural das comunidades.
Em 2025, o tema “O Futuro dos Museus em Comunidades em Rápida Transformação” convida a pensar-nos como agentes dinâmicos, adaptáveis e profundamente enraizados nas necessidades sociais do presente.
Vivemos tempos de mudanças aceleradas – sociais, tecnológicas, climáticas e políticas – que afetam as formas como as pessoas se relacionam com a cultura, com o passado e com a própria identidade. Neste contexto, precisamos de ir além do papel tradicional de guardiões de bens culturais. Devemos tornar-nos espaços vivos de diálogo, inclusão e inovação, onde diferentes vozes são ouvidas e novas narrativas construídas.
O futuro dos museus depende da nossa capacidade de nos reinventarmos: adotando tecnologias digitais, promovendo práticas sustentáveis, democratizando o acesso ao conhecimento e engajando comunidades locais através de processos inovadores e efetivos de participação, de criação e de gestão. Isso significa abrir as portas – físicas e simbólicas – para novas perspetivas, especialmente de grupos historicamente marginalizados.
Em comunidades em rápida transformação, podemos e devemos ser pontos de ancoragem cultural, locais de resistência à homogeneização e ferramentas para a construção de futuros mais justos e colaborativos. Podemos atuar como pontes entre o passado e o futuro, entre o local e o global, entre o individual e o coletivo.
Neste Dia Internacional dos Museus 2025, somos convidados a repensar o museu não apenas como um espaço para olhar o que foi, mas como um laboratório de ideias e possibilidades para o que ainda pode vir a ser.
Ao imaginar o futuro dos museus em comunidades em rápida transformação, não podemos ignorar os desafios e ameaças que surgem no cenário internacional — especialmente no que diz respeito à crescente repressão de políticas de inclusão, diversidade e justiça social em diversas partes do mundo, onde programas voltados para a equidade racial, de género e orientação sexual têm sido alvo de ataques legislativos e campanhas ideológicas. Num momento ainda em que os museus refletem e trabalham no sentido de uma narrativa crítica do colonialismo, não podemos ignorar os atuais cenários de guerra, responsáveis pela morte de milhares de civis, deslocamentos em massa, destruição sistemática de infraestrutura e um colapso humanitário de proporções alarmantes, indo contra e violando todos os valores universais que gerem a nossa vida coletiva em sociedades democráticas.
Se aspiramos, por fim, a ser espaços relevantes numa sociedade em rápida transformação, precisamos também de olhar para outros problemas contemporâneos que afetam e interessam diretamente às comunidades, desde as graves dificuldades de acesso à habitação, o aceleramento da desertificação do mundo rural, o agravamento dos fenómenos de empobrecimento e das situações de pobreza extrema, entre muitos outros.
Nestes cenários, os museus enfrentam um dilema: resistem ou se adaptam a pressões políticas?
Se desejarmos realmente ser espaços de transformação, precisamos posicionar-nos com coragem. A tentação da neutralidade institucional, muitas vezes apresentada como “equilíbrio”, pode, nesse contexto, equivaler a um grave silenciamento. É justamente nos contextos de repressão que o compromisso com a diversidade, a representatividade e a escuta ativa se torna mais necessário — e mais arriscado.
O futuro dos museus depende, portanto, das decisões éticas e estratégicas tomadas agora. Devemos ser plataformas de resistência cultural e de educação crítica. A questão é urgente: num mundo onde as transformações sociais acontecem em velocidade recorde, mas nem sempre na direção do progresso, precisamos de reafirmar o nosso papel de promotores da democracia, da pluralidade e da liberdade de expressão.
O futuro dos museus não é apenas uma questão de inovação tecnológica, de sustentabilidade e de democracia cultural — é, sobretudo, uma questão de responsabilidade política e de coragem institucional frente à regressão dos direitos universais humanos. O medo sempre foi e será sempre inimigo da liberdade.
Por fim, este dia é, para o ICOM Portugal, um dia de celebração dos profissionais de museus que recordamos, mais do que agentes, são os motores deste processo de contante passagem de testemunhos e de construção de novas leituras, com a sociedade. Os profissionais dos museus são, por isso, essenciais na continuação da construção do futuro, assente sobre o conhecimento informado e partilhado do passado. Há que continuar a valorizar as suas carreiras e as suas condições de trabalho.
Criado estatutariamente como associação em 20 de maio 1975, o ICOM Portugal celebra 50 anos de vida associativa, este ano. Enquanto representante nacional da maior organização internacional de museus e de profissionais de museus dedicada à preservação e divulgação do património natural e cultural, do presente e do futuro, tangível e intangível, o ICOM Portugal não pode deixar, hoje e este ano, em particular, de reforçar a necessidade urgente de ação por parte do Estado na tomada de medidas concretas e duradouras para a valorização dos museus portugueses e dos seus profissionais.
Um ótimo Dia Internacional dos Museus 2025!
Lisboa, 18 de maio 2025
David Felismino
Presidente do ICOM Portugal
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