
A pandemia de Covid-19 que se abateu sobre o mundo afetou de forma diferenciada as diferentes áreas. Naturalmente que a atenção geral está focada na saúde e nos violentos impactos sociais e económicos, sentidos, contudo, de forma desigual.
O universo da Cultura foi violentamente atingido, particularmente as atividades que se desenvolvem sem uma estrutura permanente de apoio. Aparentemente, o Património Cultural ficou de fora, protegido pelas equipas com situações laborais fixas. Basta, no entanto, atentar no universo dos museus e monumentos ligados à administração central do Estado para perceber que não é o caso, e que esta fragilidade é transversal a todas as instituições culturais públicas e privadas.
O violento embate do encerramento prolongado, conjugado com a fragilidade das equipas (por razões de saúde, sociais ou simplesmente pela sua exiguidade), está a deixar muitas instituições em situação de incapacidade mínima para cumprir a sua missão. A possibilidade de recurso ao digital para manter o contacto com o público veio mostrar grandes assimetrias, naturalmente potenciadas pela capacidade já instalada.
A imponderabilidade dos calendários ditou que o Relatório do Grupo de Trabalho Museus no Futuro fosse concluído e publicitado neste contexto. Dada a profundidade da avaliação da realidade em análise e a reflexão que produziu, materializada em propostas concretas e, tendo em conta o papel normativo que a Administração Pública assume, é de elementar bom senso e pragmatismo sugerir que quaisquer medidas para o setor assentem neste trabalho.
Os objetivos das instituições de Memória e de interação cultural contemporânea coincidem com os seis pilares relevantes da política da União Europeia e a abrangência do Património Cultural permite enquadrar medidas no todo do programa, contudo a sua especificidade não é compatível com a ausência de medidas direcionadas concretas. Assumindo a “centralidade estratégica da Cultura e seu financiamento”, como afirmado pelo Primeiro-ministro, consideramos que cabem nos 3 eixos de investimento delineados muitas propostas para a área dos museus e monumentos, aliás em linha com a visão da Cultura sustentada pela União Europeia.
Na vertente RESILIÊNCIA, porque a promoção da inclusão e a luta contra a exclusão não se podem fazer sem a dimensão cultural, garante do combate às desigualdades através da construção de uma cidadania consciente e ativa propomos:
1 – o reforço do PROMUSEUS direcionado para programas no âmbito do desenvolvimento social, com o valor de 500 000 euros;
2 – uma linha específica de financiamento para recuperação de património classificado, imóvel e móvel, público ou privado, direcionado para territórios de baixa densidade, com o valor de 5 000 000 euros;
3 – que pelo menos 5% dos postos de trabalho qualificado sejam adstritos à área do Património ( PRR, p. 72/73);
4 – que no contexto da modernização da oferta de ensino e formação profissional, seja atribuída ao Plano Nacional das Artes a verba de 500 000 euros, para operacionalizar o potencial de um projeto que não dispõe de dotação adequada;
5 – a oferta de um “Cheque Cultura” de 500 euros a todos os jovens que completam 25 anos (aos 18 não terão ainda a mobilidade e abrangência de gosto por experiências culturais diversificadas), não através de entradas gratuitas que não revertem em verbas para os promotores (cinema, concertos, livros, monumentos e museus, teatros), mas com transferência efetiva de verbas para os agentes do Património Cultural, no valor estimado de 50 000 000 euros.
Na vertente da TRANSIÇÃO CLIMÁTICA, porque o Património Cultural é fundamental na construção de uma sociedade informada e atuante, agente de boas práticas, promotoras de sustentabilidade ambiental, propomos:
1 – a instalação em todos os espaços patrimoniais abertos ao público, sobretudo nos que se localizam fora dos grandes centros urbanos, de postos de carregamento/abastecimento para veículos automóveis ligeiros e pesados de passageiros, num valor estimado de 1 000 000,00 euros;
2 – uma linha específica de financiamento para recuperação de património cultural natural, nomeadamente jardins e parques históricos, promovendo a parceria entre os vários níveis de ensino, designadamente na vertente profissionalizante, as instituições/agências de conservação da natureza e recursos naturais, os vários níveis da administração do Estado, num valor mínimo de 2 500 000,00 euros (PRR, p.82);
3 – incluir o Património Cultural imóvel público e privado na desejável meta de eficiência e sustentabilidade energética e prevenção contra riscos (designadamente cataclismos naturais), conjugando tecnologias inovadoras com práticas ancestrais, através de uma linha de investimento no valor de 5 000 000,00 euros (PRR, p.108).
No respeitante à TRANSIÇÃO DIGITAL, área em que os agentes do Património demonstraram, no contexto de sucessivos confinamentos e restrições à sociabilidade, uma inegável criatividade, propomos:
1 – no âmbito da ‘desmaterialização das aprendizagens’, uma linha de investimento para a qualificação das equipas e respetivas redes tecnológicas das entidades do Património Cultural, por forma a corresponder à desejável “produção de conteúdos educativos digitais de qualidade” (PRR, p.116) e implementação “de Núcleos de Inovação Educacional – disponibilizar ferramentas/equipamentos que possibilitem diferentes graus de sofisticação de aplicações tecnológicas e que permitam a aprendizagem de conteúdos educativos relacionados com as Ciências, Tecnologia, Engenharia, Eletrónica, Matemática, Artes, Línguas e Humanidades, que estimulam a aprendizagem através da resolução de problemas.”(PRR, p. 117)
2 – incluir o Património Cultural no esforço de digitalização da Administração Pública central, regional e local, sem excluir o apoio a instituições privadas detentoras de Património classificado.
A Direção da Comissão Nacional Portuguesa do ICOM
Fevereiro 2021
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